Minha lista de blogs

sábado, 5 de dezembro de 2009

UMA CARTA EM FORMA DE POESIA

Difícil ser funcionário
Nesta segunda-feira,
Eu te telefono, Carlos,
Pedindo conselho.

Não é lá fora o dia
Que me deixa assim,
Cinemas, avenidas
E outros não-afazeres.

É a cor das coisas,
O luto desta mesa;
É o regimento proibindo
Assovios, versos, flores.

Eu nunca suspeitara
Tanta roupa preta;
Tampouco essas palavras-
Funcionárias, sem amor.

Carlos, há uma máquina
Que nunca escreve cartas;
Há uma garrafa de tinta
Que nunca bebeu álcool.

E os arquivos, Carlos,
As caixas de papéis:
Túmulos para todos
Os tamanhos de meu corpo.

Não me sinto correto
De gravata de cor,
E na cabeça uma moça
Em forma de lembrança.

Não encontro a palavra
Que diga a esses móveis.
Se os pudesse encarar...
Fazer seu nojo meu...

Carlos, dessa náusea
Como colher a flor?
Eu te telefono, Carlos,
Pedindo conselho.

Por João Cabral de Melo Neto.

Nenhum comentário: