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terça-feira, 31 de março de 2009

Diário: Banheiro Fantasticamente Fabuloso!


DIÁRIO: BANHEIRO FANTÁSTICO...

Era lá no banheiro onde eu conseguia desvendar cada parte do que eu sou. Quando eu era pequena o banheiro era o meu melhor amigo. Eu transportava o meu mundo todo para lá. Era aquele espaço; amigo-quarto-baú, pedaços do meu corpo.
Naquele lugar eu descobria o meu mundo a cada momento em que ele se renovava...
Eu lembro, quando foi à primeira vez que eu olhei para o objeto mais intrigante e provocador que me atraia; A PRIVADA. Foi como imã que ela me puxou. Imaginei sua quina, sua beirada...Pensei que ela poderia me proporcionar prazeres encantadores...Não sei como foi esse encontro...Eu e a privada...Sei que aos pouquinhos fui agachando o meu corpinho pequeno, sete anos, enganchando o meu sexo à beirada...Lembro que comecei a balançar...Era como um brinquedo, um balança-balança...Acho que tinha a mistura de algo delicioso e ao mesmo tempo podre...Onde, talvez, eu misturasse tudo...
O gozo...Mijo...A descarga...Descarregar...Descarregando tudo...
A quina era dura e doía um pouco, mas, passava...Passava...Isso acontecia repetidas vezes...Fiquei viciada pela privada...Lembro, também, de quando eu terminava, eu me sentia tão abominável que eu rezava, apesar de nunca ter sido católica devota...Mas, eu rezava...Quando eu abria a porta do banheiro fantástico....Encarava a casa...Saia do mundo da magia podre e lúdica dos meus segredos... E reinava diferente no mundo real...Fiz do banheiro fantástico, meu fiel escudeiro...Cheio de possibilidades inusitadas na minha triste-alegre cabecinha...
Descobri no banheiro... Uma das casas mais fabulosas da Barbie...Era fantástico...!!
Digo isso porque quando eu era menor que sete ou quase sete anos...Eu tinha o sonho de ter a coleção inteira da Barbie...De ter um casarão da Barbie...Mas, era tudo muito caro...Meus pais não tinham condições...Pedia para o meu pai e ele dizia; “Filha porque não escreve para Silvio Santos, o programa“Porta da Esperança” e pede a coleção inteira?” Eu ficava horas imaginando duas cenas: Eu lá em Silvio Santos numa expectativa tremenda esperando...A porta se abrindo...Ele lendo minha cartinha... a porta se abrindo...Aquela coisa toda...Aiiiiii!!!!A coleção TODA da Barbie...!!!Ou...A versão mais pessimista...A porta se abrindo e Silvio Santos fazendo: OOOOOOOOOOOOh!! Seria uma decepção...!!
Acho que eu não arriscava meus sonhos por medo da decepção...
Então...O banheiro me entendia...
Ele virou meu casarão da Barbie...! Lembro da arquitetura montada por mim: O chuveiro era uma cachoeira enorme, dentro da casa fechada por vidros maravilhosos...Lembro que a pia era uma banheira- piscina...Eu colocava shampoo bastante...Isso era um horror porque minha mãe não entendia como o Shampoo acabava tão rápido...Ela reclamava... Eu silenciava...Ela não entendia a profundidade...A Barbie precisava daquela piscina-banheira...! Os armários do banheiro...Eram salas de televisão, eu tirava tudo que tinha dentro...Eu pegava as toalhas e fazia de sofá...Ficavam lindos e aconchegantes super...Os quartos eram no chão...Era dividido...Tinha o quarto da Barbie e do Bob e tinha o quarto dos filhos; Eles tinham seis filhos. Era engraçado porque os filhos eram bem diferentes...Era um casal da “Família Coração” da Barbie mesmo, eram os caçulas, e tinham os irmãos...Uma Chuquinha, Umas gêmeas, eram duas bonequinhas de cabelos bem pretos, espanholas que eu e a minha irmã havíamos ganhado... E tinha o menino...Era o agarradinho...Eu era louca por ele...Ele era horroroso e eu o achava lindo...Lembro o nome dele: João Daniel...! Coloque esse nome porque fiquei um tempo fã de uma cantora que o seu filho se chamava João Daniel...Então, tive que colocar o nome do meu agarradinho João Daniel...!
As brincadeiras se revezavam no banheiro...Eu tinha um palhaço, tão lindinho e monstruoso, ele tinha duas caras o safado...O nome dele era Brinca-Bronca, veio com esse nome...O nariz desse palhaço...Fazia-me cócegas...
No banheiro eu fui crescendo...O tempo ia passando...Era lá onde eu chorava também...Era lá onde eu fazia os meus dramas reais e imaginários...Lembro, eu chorando, me olhando no espelho para ver como era o meu choro...Lembro, quando eu brigava com minha irmã...Eu entrava lá correndo, trancava a porta e depois eu dava um grito enooooooooooormeeeee de pavor para ela achar que eu me matei...Eu lembro, ela gritando...Batendo na porta...Eu sofria por dois motivos: Um se fosse verdade...Que coisa horrível...!E dois, porque minha irmã ficava desesperada...Isso era tão rápido, que a porta do banheiro abria-se logo. Eu era a maior fã da minha irmã...Talvez, eu fizesse isso para chamá-la atenção quando a gente brigava...(Um parêntese para falar de minha irmã) Quando a gente era pequena eu era uma criança que não gostava de um monte de coisas...Tinha umas coisas que eu achava lindo gostar, mas, a porcaria do meu paladar não gostava...Minha irmã comia goiabada com queijo...Eu detestava...Mas, era tão lindo vê-la comer...Aí eu comia, mesmo detestando, só para ficar igual! Tinha água de coco que ela tomava, eu não gostava...Mas, fazia de tudo para beber...O pior de tudo era que a minha irmã me revelava sempre para mim mesma: “Você não gosta de goiabada com queijo e nem de água de coco, só faz isso para me imitar...” Eu sofria.
Minhas outras lembranças do banheiro, essas eram as partes suicidas...Quando eu brigava com meus irmãos ou meus pais...Eu entrava no banheiro e fazia uma carta de despedida de suicídio...Era sempre assim que começava: “Me matei porque não pude resisti a tal agressão...” Mas, no final da carta era tão triste imaginar meus pais e meus irmãos sofrendo, eu no caixão, eu sofria tanto...Chorava tanto, que logo em seguida eu os perdoava...Porque imaginava esse acontecimento...Aí, não queria nada disso...Saia do banheiro...Eles estranhavam...Meus olhos inchados, mas, eu os abraçava com saudade da possível tragédia e já estava tudo bem e perdoado no meu coração...!
O Banheiro era também meu lugar de danças e paixões...Eu tinha uma amiga que sempre ia ao banheiro comigo....Ela se requebrava toda...Eu colocava um som...Música... E ficava a vendo dançar...Sentava na latrina, era a platéia...! Um dia, essa menina dançou tanto, jogando suas pernas finas para um lado e para outro...De tanto dançar como uma gazela doida...Ela jogou sua perna no porta papel-higiênico e quebrou o porta-papel...Tive que assumi a culpa que não era minha...Ela ficou sem jeito...Minha mãe desconfiou de algo a mais...Mas... Nada a revelar, éramos amigas APENAS de requebrados dançantes...
O banheiro e a privada já me traíram uma vez...Fiquei bem magoada...Eu tinha seis anos, vontade de fazer xixi, pronta para escola...Corri. O corredor estava molhado, não tinha visto...Escorreguei...Eu estava com um copo de vidro na mão...Minha cabeça foi para a fechadura...Quebrou: A cabeça; O copo bateu no chão...Bateu na privada e não quebrou...Minha cabeça quebrou...
Fiquei magoada com o banheiro...Mas, passou...Passou...Passou...
Meus doze anos...Fiquei menstruada....Foi estranho...Esse dia eu estava na casa de minha melhor amiguinha, naquela época, brincando de Barbie...Cheguei em casa...Minha irmã estava tomando banho, fui fazer xixi...Aí...Uma coisa marrom em minha calcinha...Olhei, observei...Perguntei a minha irmã “você sabe se eu fiz cocô hoje?” Ela me respondeu rindo e com impaciência: “Como eu vou saber até do seu cocô...?? ” Cheirei a calcinha...Não tinha cheiro de cocô...Fiz a retrospectiva do meu dia...Aí falei.... “Tem uma coisa estranha marrom na minha calcinha...” Ela gritou com felicidade estranha. Figura estranha minha irmã nessa comemoração: ”Está menstruadaaaaaaaa...!!!” Tomei um susto!!Fiquei feliz e triste ao mesmo tempo...Estava virando uma mulher e não queria e queria...Meu primeiro pensamento foi: “Como uma mulher brinca de bonecas, de Barbie?” Pânico total!! Eu era VI-CI-A-DA nas Barbies, na quina da latrina, no palhaço Brinca-Bronca...Que complicação...Lembro de mim conversando com minha melhor amiguinha, dizendo a ela que eu já era uma mulher e brincar de bonecas eu não tinha mais vontade...Triste...Porque era mentira...Eu cortei relação com as minhas Barbies sem nem ao menos ter me despedido delas...Triste...Triste...
Lembro das revelações CHO-CAN-TES no banheiro...Era época de Natal...Eu estava muito ansiosa para a chegada do meu presente...Descobri uma revelação que abalou o meu mundo...PAPAI NOEL NÃO EXISTIA...Chorei, corri para o banheiro, minha irmã ouviu, era um choro de dor, de traição...Ela correu, abri a porta...Falei: “PAPAI NOEL NÃO EXITE, VOCÊ SABIA????” Ela tentou disfarçar...Me chateei porque nesse momento vi a cara dela de mentira...Ai pedi a verdade...Lembro a voz que ecoou em mim...”É ISSO, PAPAI NOEL NÃO EXISTE....” “NÃOOOOOOOOOOOOOO!!”. Chorei muito, mas, superei a bomba.
Outra revelação, terrivelmente, essa libidinosa...Meu irmão...Lembro, ele deveria ter uns 16 anos...Na escola ele tinha uma namoradinha...Minhas amigas falavam...”Seu irmão deve transar com a namorada dele MUITO”. Eu achava aquilo um absurdo, eu tinha plena convicção da virgindade do meu irmão...Tinha plena convicção da certeza das suas palavras...Ele dizia para minha mãe que ia ao cinema...Claro que eu achava que ele ia...Essas acusações da virgindade do meu irmão duraram e me perturbaram por um tempo...As minhas amigas até criaram apelido para ele, para mim, claro, “Virgilio”...Eu sofria. Resolvi esclarecer essa dúvida...Sempre com a minha irmã, a que me revelava tudo....Chamei ela no banheiro e baixinho perguntei: ”Ele é virgem não é??”. Ela rindo falou: “Claro que não, boba...” Sofri, mas, tive que aceitar aquela mentira do meu irmão. Fiquei dias olhando para ele diferente...Mas, passou.
O banheiro...Uma passagem para o mundo do circo, do teatro, da dança...O banheiro, Uma passagem para perdas...O banheiro uma passagem para remodelar o mundo...
Quando a arte entrou em minha vida e eu entrei na arte... Tinham umas pessoas que eu admirava de formas diferenciadas...Essas pessoas viraram amigos-amigas, casos-fieis imaginários na minha história...Essas pessoas existiam...Mas, eu nem me aproximava muito delas, era fabuloso tê-las de mentirinha no banheiro do meu teatro ou no teatro do meu banheiro...Tinha uma menina que era especial...Duas contas azuis nos olhos...Eu a beijava sempre...Tinha um menino, que eu adorava imaginar a gente tendo um caso super complicado, o nome dele imaginário era: Totila. Ele tinha cara desse nome, mas pena, não se chamava assim. Eu lembro das festas imaginárias que eu fazia no banheiro...Essa menina de olho azul sempre estava...Tinham outras figuras também...Eram festas louquíssimas...Todo mundo ficava com todo mundo...Um som alto...Mas, o que acontecia sempre em seguida a festa imaginária do cabide...Minha mãe...Batia na porta e dizia “Está alto o som” Me enraivava...Porque aí o mundo fantástico caia na real...
Parte da remodelação visceral: O banheiro foi meu companheiro fiel quando perdi uma coisa tão linda-anjo em minha vida. O banheiro segurou a minha dor...Foi nessa virada...O peito em sangue.... Que o banheiro me soprou o mergulho para o mundo...Foi depois da perda do Anjo...Ele era o meu guardião de belezas puras na vida. Nessas virada, o banheiro me falou: ”Corre para o teatro, corre para o circo, corre para a dança...” Aí corri para TUDO atirando... O Banheiro Chorou comigo me dando colo sempre... Chorou comigo uma menina especial que tinha por apelido Minhoquinha...Ela era a Minhoquinha mais linda e pura que desistiu de viver... Ela me deixou a palavra ENCANTO em tudo...Também, chorei por um menino que requebrava como ninguém....Chorei um tio, chorei uma tia, chorei outra tia, chorei meu Dindo, chorei...Mas, o banheiro me dizia que a vida se remodelava...
REMODELEI.
Foi aí que virei...Me remodelando...
Lembro do banheiro eu ensaiando peças, lembro do banheiro me soprando meus desejos dúbios: “João ou Maria ? ” ...Lembro no banheiro minha virada para ser mulher...Meu cabelo, minha cara mudando, pessoas que não existiam entrando, dor do novo.... Outras saindo, dor do velho...Lembro, no banheiro o vômito, o choro, o amadurecimento, os cortes, as descobertas, a vida, o íntimo, inusitado... Lembro no banheiro eu pulando... Um novo ar entrando, uma brisa...Meu corpo se transformando, minha pele esbranquiçando, meu cabelo mudando...O mundo se remodelando...Eu sendo “certa”, ambígua, arte, brisa na cara, eu sendo sempre com ele...Livre...
Foi lá no banheiro que encontrei a chave para tudo...No banheiro fabuloso dos meus sonhos secretos...

Um comentário:

Joe'A disse...

Cinzel da alma

A dor... cinzel cruel
corta a alma
corta a carne
corta o coração
esculpindo, cinzelando
cortando arestas
boleando as formas
ferindo, cicatrizando
torturando erros e pecados
boleando as virtudes
domando as paixões
cimentando pedaços
e da dor
já em cinzas
a Fenix esculpida
renascerá
em direção ao sol
voará
pronta
para a exposição
da Vida

Joe